A inclusão de novas palavras e expressões em projetos de lei, desde que corrija imprecisões técnicas ou torne o sentido do texto mais claro, não configura emenda aditiva.
Esse entendimento é do Plenário do Supremo Tribunal Federal, que decidiu nesta quinta-feira (24/10), por 6 votos a 5, pela constitucionalidade da alteração na Lei de Falências e Recuperação Judicial (Lei 11.101/2005) que incluiu cooperativas médicas no regime.
Prevaleceu o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes. Ele foi acompanhado pelos ministros Cristiano Zanin, Nunes Marques, Edson Fachin, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso.
O ministro Flávio Dino abriu divergência e ficou vencido. Ele foi seguido pelos ministros André Mendonça, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes.
Irregularidade na tramitação
O dispositivo, incluído na Lei de Falências pela Lei 14.112/2020, afasta a aplicação dos efeitos da recuperação judicial nas cooperativas, com exceção das da área médica.
A ação foi movida pelo ex-procurador-geral da República Augusto Aras. Ele alegou irregularidades na tramitação do projeto legislativo que deu origem à norma.
Segundo Aras, a exceção aplicada às cooperativas médicas não constava do projeto de lei aprovado pela Câmara dos Deputados e encaminhado ao Senado. Por conter assunto diverso do texto votado pelos deputados, a alteração deveria ter tramitado como emenda aditiva para, se aprovada pelo Senado, retornar à Câmara.
Aras sustentou, porém, que isso não ocorreu, e, embora o trecho tenha sido vetado pelo presidente da República, o veto foi derrubado pelo Congresso Nacional.
O PGR argumentou que essa circunstância viola o princípio constitucional do bicameralismo, segundo o qual toda emenda a projeto aprovado por uma das Casas deve obrigatoriamente retornar à outra, para que esta se pronuncie somente sobre esse ponto, de forma definitiva.
Recuperação respaldada
Alexandre votou na sessão de quinta-feira passada (17/10) para afastar a alegação de desrespeito ao processo legislativo no caso, sustentando que a norma é constitucional.
De acordo com o magistrado, o veto da Presidência da República ao dispositivo não foi por inconstitucionalidade (análise jurídica), mas por motivo político — contrariedade ao interesse público.
Uma vez que o Congresso Nacional derrubou esse veto, os parlamentares concluíram que não houve inovação legislativa, mas apenas uma emenda de redação, citou Alexandre. Ele mencionou que nem o Executivo, nem o Legislativo citaram irregularidades no processo.
Ao seguir o relator, Zanin apontou que a grande maioria dos deputados e senadores não enxergou vícios no procedimento, tanto que apenas um partido, o PSOL, questionou a norma. Já Fachin ressaltou que o STF precisa deferir as deliberações internas tomadas pelo Congresso.
Voto divergente
Também na quinta-feira passada, Flávio Dino abriu a divergência por entender que a derrubada do veto presidencial não eliminou o vício de origem no processo legislativo que incluiu as cooperativas médicas no regime de recuperação judicial.
Conforme o ministro, a Lei de Falências se destina a sociedades empresárias, e cooperativas médicas não se enquadram nesse conceito, segundo o artigo 1º da norma. Já o artigo 2º exclui expressamente do procedimento de recuperação judicial cooperativas de crédito, consórcios, entidades de previdência complementar e cooperativas de saúde.
O dispositivo, portanto, promoveu alteração substantiva no projeto de lei, declarou Dino. Por esse motivo, a proposta deveria ter retornado à Casa em que foi iniciada, para ser novamente analisada pelos parlamentares. Como isso não ocorreu, houve violação ao devido processo legislativo, ressaltou o ministro.
Ao acompanhar a divergência, Mendonça disse que a alteração não foi apenas formal, pois contraria toda a sistemática da Lei de Falências. Cármen Lúcia avaliou que houve vício na aprovação do PL, pois a inclusão de uma nova norma se deu sem a devida apreciação por deputados e senadores.
“Se houve alteração substantiva, houve desrespeito ao devido processo legislativo”, afirmou Gilmar, destacando que atos de cooperativas não se sujeitam à recuperação judicial.
ADI 7.442
Fonte: ConJur