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Recuperação judicial não pode ser encerrada desprezando a supervisão, diz TJ-SP

A supervisão e a fiscalização da recuperação judicial não podem e não devem ser desprezadas. Esse foi o entendimento da 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo ao reformar decisão de primeira instância que havia homologado, com ressalvas, o plano de recuperação judicial de uma empresa do setor alimentício, declarando, simultaneamente, o encerramento da recuperação.

Por unanimidade, a turma julgadora afastou o decreto de encerramento da recuperação judicial e determinou a manutenção do procedimento, com supervisão judicial pelo período legal de dois anos, tal qual previsto no artigo 61, caput, da Lei 11.101/2005.

Um credor recorreu ao TJ-SP e defendeu a necessidade de supervisão da recuperanda em razão do risco de descumprimento do plano. O relator, desembargador Fortes Barbosa, destacou no voto que o encerramento da recuperação judicial, com supressão do período de supervisão, passou a ser admitido após alteração trazida pela Lei 14.112/2020.

“Ao ser substituída a imposição derivada do uso do verbo ‘permanecer’ no futuro do presente pela conjunção verbal ‘poderá determinar’, foi, sem dúvida, concedida uma faculdade de abreviação do prazo de dois anos ao Estado-Juiz, mas que deve ser usada com muito comedimento, conforme uma avaliação cuidadosa do contexto fático”, explicou.

Mas, para o magistrado, a supressão do período de supervisão, na maioria dos casos, potencializa o prejuízo aos credores, pois somente após a concessão da recuperação é que a viabilidade do cumprimento efetivo das regras será colocada à prova, testando a possibilidade de soerguimento da atividade empresarial na prática.

“A supervisão e a fiscalização não podem e não devem ser desprezadas. Ao Judiciário, não está destinado o papel de testemunha dos atos praticados pelo devedor empresário, cabendo-lhe a preservação da legalidade e o zelo pela lisura dos atos, salvaguardando a empresa, como estrutura destinada à promoção da produção e circulação de mercadorias e serviços, bem como a posição dos credores, submetidos a uma novação condicionada de seus créditos a partir do deferimento da recuperação.”

Barbosa afirmou que, no exercício da supervisão e fiscalização, o Judiciário pode e deve tomar medidas destinadas à preservação e à reorganização da empresa, mesmo em confronto com os interesses ou os desejos do empresário, o que inclui até a substituição da administração em casos mais graves, mas, frente ao encerramento decretado, os credores só poderão optar pela execução específica da obrigação ou pelo ajuizamento de um pedido de falência, mas a novação já terá se consolidado, deixando os credores em uma posição mais desfavorável.

“Possibilitar, então, fosse suprimida a supervisão judicial nas condições estabelecidas na sentença atacada possibilita seja retirada a efetividade dos postulados da lei vigente, promovida uma deturpação absoluta, com o uso da recuperação judicial apenas como mera medida defensiva, destinada à obtenção de uma artificial suspensão do trâmite de execuções e à diminuição do passivo, o que não pode ser admitido”, completou.

Ruim para todo mundo

Na visão do relator, a supressão da fiscalização pode não ser positiva nem mesmo para o próprio devedor, pois o encerramento da recuperação não gera um benefício imediato: “Os agentes de mercado e, em particular, as instituições financiadoras levam, normalmente, em consideração o histórico da empresa, sendo ilusório conceber um novo e amplo acesso aos instrumentos de crédito.”

Nem mesmo para o Estado-Juiz, disse Barbosa, se vislumbra inequívoca vantagem, pois, em caso de descumprimento do plano, os credores ajuizarão execuções ou pedidos de falência, de maneira que nem sempre o encerramento da recuperação judicial resultará em um desafogamento automático da máquina judiciária.

No caso dos autos, o magistrado justificou a decisão em um parecer em que o administrador judicial diz que a recuperanda não apresentou informações sobre a regularização de seu passivo fiscal, além da ausência de atividades em algumas unidades da empresa. Com isso, Barbosa considerou “prudente” que a recuperação seja supervisionada, para atingir a necessária probabilidade de cumprimento do plano.

“Não há dúvidas, então, quanto a alteração da situação das empresas, que atualmente estão sem exercer a atividade empresarial em sua plenitude, de maneira que o encerramento da recuperação judicial com supressão do período de supervisão foi medida açodada, nada a justificando agora, frente à conjuntura fática noticiada nos autos”, concluiu o relator.

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Processo 1057402-52.2019.8.26.0100

Fonte: ConJur

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