Precedentes tratam de bens transferidos a empresas e que são utilizados para moradia
Sócios que transferiram a titularidade de imóveis em que residem para empresas conquistaram no Tribunal Superior do Trabalho (TST) importantes precedentes para tentar afastar a penhora sobre esses bens. O ministro Breno de Medeiros, em uma recente decisão, entendeu que eles detêm legitimidade para atuar nos processos. Em um outro caso, sem discutir esse ponto, a 7ª Turma derrubou o bloqueio sobre um imóvel por considerá-lo bem de família.
A discussão envolve a Lei nº 8.009, de 1990. O artigo 1º afirma que imóvel residencial próprio de casal ou de entidade familiar é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida. Contudo, nos casos em que o bem está registrado em nome de empresa ou holding, alguns juízes, principalmente trabalhistas, normalmente resistem para declarar a impenhorabilidade.
Um desses casos foi analisado recentemente pelo ministro Breno Medeiros, depois de primeira e segunda instâncias negarem o pedido de uma sócia. Ele reconheceu a legitimidade dela para discutir a penhora sobre imóvel que está em nome de uma empresa no Estado de São Paulo. O julgador destacou que o tema é novo na Corte e, por isso, o recurso foi aceito, com base no princípio da transcendência – filtro adotado pelo TST.
O caso analisado pelo ministro Breno Medeiros reúne diversas ações judiciais contra um grupo econômico na área de transportes e empreendimentos agropecuários. A dívida com os trabalhadores gira em torno de R$ 20 milhões. Por meio da desconsideração da personalidade jurídica, localizou-se o imóvel onde mora a sócia, em São José dos Campos. O bem, no valor de R$ 6 milhões, está em nome de uma empresa de empreendimentos agropecuários.
No Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo, negaram o pedido da sócia. De acordo com a decisão, “se o bem não lhe pertence, não pode invocar a proteção legal relativa ao bem de família”. O entendimento teve como base o artigo 1º da Lei nº 8.009, de 1990, que trata, segundo os desembargadores, apenas de “imóvel próprio do casal ou da entidade familiar”.
No TST, o ministro Breno de Medeiros usou o mesmo dispositivo para dar razão à parte. Para ele, a norma visa proteger o direito à moradia. “Ainda que o imóvel seja de propriedade da pessoa jurídica, a lei protege a moradia e a dignidade de todos que nela habitam, não a simples propriedade, pelo que revela-se evidente o interesse da parte, não havendo falar em ausência de legitimidade”, diz em seu voto (AIRR-12551-05.2016.5.15.0003). A decisão foi publicada no dia 5 deste mês.
A decisão da 7ª Turma reformou entendimento do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) do Paraná. Os desembargadores entenderam que o oferecimento configurou renúncia à impenhorabilidade. Além de manterem a constrição, consideraram a atitude dos sócios atentatória à dignidade da Justiça e aplicaram multa de 5% sobre o valor da condenação, à época calculada em R$ 886 mil.
No TST, o relator do caso, ministro Douglas Alencar Rodrigues, entendeu que a impenhorabilidade do imóvel residencial familiar está estabelecida no artigo 1º da Lei nº 8.009, de 1990, e que o artigo 6º da Constituição Federal inclui a moradia como direito fundamental, irrenunciável pela pessoa devedora. Ele destacou que o imóvel, apesar de estar registrado em nome de pessoa jurídica, era o local da residência dos sócios e que se trata de empresa familiar.
O relator manteve, porém, a multa aplicada pelo TRT. “O reconhecimento da impenhorabilidade não afasta a conclusão de que configura ato atentatório à dignidade da jurisdição a nomeação de bem que não pode ser alienado judicialmente”, conclui em seu voto (RR-678-15.2013.5.09.0024).
A decisão da 7ª Turma foi unânime.
Fonte: Valor Econômico