Por Adriana Aguiar
O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) permitiu a compensação de valores entre uma empresa e outra em recuperação judicial. O processo envolve a Abengoa Bioenergia Agroindústria e a Alvean Sugar e trata do descumprimento de contrato para entrega de açúcar em 2017. A Abengoa está em recuperação desde setembro daquele ano.
A compensação só foi possível, segundo a decisão, diante da confissão da Abengoa de que o descumprimento contratual foi anterior à distribuição da recuperação judicial. Os desembargadores da 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial levaram em consideração o parágrafo 2º do artigo 49 da Lei de Falência e Recuperação Judicial (Lei nº 11.101, de 2005).
Pelo dispositivo, “as obrigações anteriores à recuperação judicial observarão as condições originalmente contratadas ou definidas em lei, inclusive no que diz respeito aos encargos, salvo se de modo diverso ficar estabelecido no plano de recuperação judicial”.
De acordo com o processo, a Alvean adquiriu 60 mil toneladas de açúcar da Abengoa, que tinha se comprometido a entregar o produto em oito lotes entre maio e outubro de 2017. Porém, parte não foi entregue e ficou acordado entre as empresas a devolução de R$ 766 mil à Alvean.
Os créditos não tinham constado na primeira lista de credores da recuperação judicial. Porém, foi incluído posteriormente, o que fez com que a Alvean entrasse na Justiça para pedir que ficassem de fora do processo.
A empresa apresentou no processo uma troca de e-mails, no dia 20 de setembro de 2017. Nela, as partes concordavam com a compensação em razão da não entrega do todo o açúcar contratado. A data é anterior à recuperação judicial da Abengoa. O processo foi distribuído no dia 25 de setembro, o que foi levado em consideração pelo relator do caso, desembargador José Araldo da Costa Telles.
Para ele, “particularmente em sede de uma recuperação judicial, não há como reprimir, salvo demonstração de fraude ou conluio entre credor e recuperanda, a compensação ocorrida antes do ajuizamento”. Por isso, concluiu que o crédito da Alvean acabou satisfeito por meio de compensação e determinou a retirada do valor do quadro geral dos credores da Abengoa (agravo de instrumento nº 2060043-39.2018.8.26.0000).
O advogado Antonio Carlos de Oliveira Freitas, sócio do Luchesi Advogados, que assessorou a Alvean no processo, afirma que a decisão pode ser um precedente para empresas que têm créditos a receber de recuperandas e têm meios de comprovar que o fato gerador foi anterior ao pedido de recuperação. Ele acrescenta, porém, que as decisões sobre compensações firmadas durante o período de recuperação têm sido controversas na Justiça.
Para a advogada Ligia Azevedo Ribeiro, sócia do Rayes & Fagundes Advogados, a decisão do TJ-SP foi correta “por determinar que devem ser respeitadas as regras gerais de compensação do Código Civil e as disposições contratuais, ressalvada a hipótese em que a compensação tem a finalidade de fraudar a recuperação judicial”.
A discussão passa a existir quando a compensação é realizada durante a recuperação judicial, segundo Ligia. “Nesse cenário não estamos apenas tratando da simples relação entre duas partes, mas de todos aqueles credores que têm a expectativa de recebimento de seus créditos na forma do plano”, diz. Ela entende que, nessa hipótese, a compensação deve ser analisada com muita cautela pela Justiça.
Paulo Macedo Garcia Neto, do Macedo Garcia Advogados, destaca que, no caso analisado pelo TJ-SP, além de ser anterior à recuperação, não houve alegação de fraude nem de conluio. Por isso, considera a decisão correta.
Procurados pelo Valor, os advogados da Abengoa não retornaram até o fechamento da edição.
Fonte: Valor Econômico