Por Camila Maia
O juiz da recuperação extrajudicial da Queiroz Galvão Energia (QGE) levantou dúvidas sobre seu plano de recuperação, aprovado por 62% de seus credores em novembro, depois que um deles trouxe à tona o fato de que a gestora americana Castlelake foi a única a votar pela aprovação do documento e já está atuando como administradora da companhia. A dívida total abrangida pelo plano soma R$ 3,85 bilhões, sendo que R$ 2,8 bilhões estão nas mãos da gestora, que comprou esses créditos recentemente, depois de avaliar adquirir a própria companhia.
O juiz Marcelo Barbosa Sacramone, da 2ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, não acatou os pleitos dos credores para indeferir o pedido de recuperação extrajudicial e nem para afastar os administradores da recuperanda. Ele indicou, contudo, disposição em avaliar um pedido de impugnação do plano de recuperação judicial, assim como desconsiderar os votos dos veículos do Castlelake que votaram a favor da aprovação do documento, se for provado que houve conflito de interesses.
“Caso efetivamente seja comprovado o conflito de interesses alegado, os votos do Fundo Apus e Vientos Securitizadora não seriam computados, sendo de competência deste juízo tão somente indeferir a homologação do plano”, diz a decisão do juiz.
O plano de recuperação extrajudicial da Queiroz Galvão Energia foi apresentado em novembro, já com o aval de credores representantes de 68,2% da dívida total da companhia, sendo 60,7% dos detentores de créditos quirografários (que somam R$ 2,663 bilhões) e 81,4% de aprovação daqueles detentores de créditos com garantia real (R$ 1,185 bilhão).
No início de janeiro, contudo, a credora Eng Participações, dona de créditos da ordem de R$ 258,2 milhões, ajuizou uma petição na qual classificou o plano aprovado de “simulado e fraudulento”, devido a um suposto conflito de interesses. Os credores FDIC Apus e Vientos Securitizadora, que foram os credores que aprovaram o plano, são veículos do Castlelake.
O Castlelake também concordou, de antemão, com a principal proposta de pagamento dos créditos: trocá-los por participação em uma sociedade de propósito específico (SPE) que será criada para ser a holding dos ativos de energia da QGE pós-reestruturação. A alternativa para aqueles que não queiram ser sócios da empresa é consideravelmente menos atrativa. Será feito o pagamento em dinheiro, correspondente a 2% dos créditos abrangidos pelo plano, com desembolso apenas no 10º aniversário da sua homologação.
Paralelamente à assinatura do plano, os veículos do Castlelake assinaram ainda um acordo de suporte à reestruturação (RSA, na sigla em inglês). O documento definiu uma administração interina para a companhia, e nomeou Gustavo Ribeiro como seu diretor comercial. O problema, segundo a petição da Eng, é que Ribeiro também aprovou o plano de recuperação extrajudicial em nome da Vientos Securitizadora. Além disso, a Queiroz Galvão Energia se comprometeu a emitir R$ 200 milhões em debêntures para pagar os “credores apoiadores” signatários do RSA.
O juiz Sacramone rejeitou o pedido de afastamento dos administradores por se tratar de uma recuperação extrajudicial, mas disse que a matéria da impugnação do plano deve ser apreciada em um momento futuro. Além disso, “diante dos indícios de que os credores signatários já teriam assumido o controle da gestão das recuperandas”, ele determinou que alienações ou onerações de direitos ou ativos da Queiroz Galvão Energia sejam, obrigatoriamente, submetidos à sua análise prévia, a fim de não prejudicar os demais credores da companhia.
Como o edital da recuperação judicial foi publicado em 19 de dezembro, e o recesso forense teve início no dia seguinte, tendo terminado em 21 de janeiro, o prazo final para apresentação das impugnações vai terminar em 19 de fevereiro. Na ocasião, o juiz Sacramone escreveu que vai verificar se o quórum de três quintos dos créditos, obrigatório por lei, foi de fato atingido para que a recuperação se enquadrasse como extrajudicial.
A Castlelake é uma gestora com sede em Mineápolis, nos Estados Unidos, especializada em ativos “alternativos”, com performance abaixo do esperado e problemas financeiros. A gestora tem uma equipe voltada para investir em setores em reestruturação ou recuperação judicial no mundo. Hoje, a Castlelake tem US$ 12,8 bilhões sob gestão, segundo informações do seu site.
Fonte: Valor Econômico