Por Victória Mantoan
O embate entre o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Triunfo Participações e Investimentos (TPI) ganhou tons mais fortes esta semana. O banco de fomento acusa o grupo de concessões de infraestrutura de ter mentido para o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) sobre a posição acionária do BNDES quando foi feito o pedido de recuperação extrajudicial e pede nos autos do processo a revogação da decisão que suspendeu as execuções de dívidas contra a empresa. As informações constam de petição protocolada na terça-feira pelo banco. O juiz Marcelo Sacramone, responsável pelo processo, concedeu ontem prazo de cinco dias para a empresa se manifestar.
Há duas ações de execução contra a Triunfo, que somam R$ 980,5 milhões. sem atualização. Trata-se de compromissos de duas concessionárias – Concebra e Concer.
Tanto a holding, junto com outras subsidiárias, quanto a Concer protocolaram em 22 de julho pedidos de recuperação extrajudicial para reestruturar R$ 2,1 bilhões e R$ 353,8 milhões em dívidas, respectivamente. Nos pedidos, incluíram a suspensão de execuções relacionadas a créditos submetidos ao plano, dentre os quais aqueles detidos pelo banco de fomento. O processamento do pedido foi deferido com essa suspensão.
Mas, para fazer jus à homologação de uma recuperação extrajudicial, a empresa precisa ter a aprovação de ao menos 60% dos credores sujeitos ao plano apresentado.
Mas isso só foi possível porque a empresa retirou o BNDES, maior credor, da conta para se obter o quórum – ele foi considerado um credor sujeito ao plano mas não votante. A razão é seu braço de participações, a BNDESPar, ser acionista do grupo.
Segundo o BNDES, porém, a empresa apresentou no pedido a participação acionária da BNDESPar de março de 2017, de 14,75%, mesmo sabendo que esse não era mais o tamanho da fatia desde meados de junho. Já naquele mês, a BNDESPar tinha 9,13% da TPI.
Na véspera do pedido de recuperação da empresa, diz o banco, a fatia no capital social da Triunfo era de 5,09%. “O pedido de homologação foi feito com manifesto propósito protelatório, para impedir o prosseguimento das ações de seus credores, e com base em informações inverídicas, que são de total conhecimento das recuperandas e não foram apresentados a este MM. Juízo”, diz o documento.
A discussão é considerada espinhosa. A lei de recuperação judicial e de falências prevê situações de vedação de voto que têm como referência participação acionária superior a 10%, mas, dentre advogados, a forma de aplicação, especialmente em uma recuperação extrajudicial, não é consenso.
O BNDES defende que, com fatia menor que 10% do capital da empresa, detida por uma subsidiária integral, não se aplicaria a vedação e que, se o cálculo fosse feito corretamente – ou seja, incluindo a dívida do banco na base -, a TPI não teria conseguido taxa de aprovação suficiente para ter direito à homologação do plano. De fato, os créditos que aprovaram os planos do grupo não atingem 60% se considerada a dívida do BNDES. O banco destaca que haveria apenas 17,8% de aprovação dos credores quirografários da TPI e 30% de aprovação dos credores da Concer.
Além da revogação da decisão que levou à suspensão das ações, execuções e pedidos de falência, o maior credor da Triunfo pede que as recuperandas sejam condenadas por litigância de má-fé.
No caso da TPI, a dívida do banco sujeita ao plano é de R$ 1,18 bilhão, pouco mais da metade do total e cerca de 70% dos créditos quirografários – categoria em que se concentra todo o crédito do BNDES. Na Concer, a parcela da dívida do BNDES soma R$ 221 milhões, que supera os 60% do total. Neste caso, há apenas uma categoria de credor. Isso significa que, concedido o direito de voto ao BNDES, a Triunfo não conseguiria aprovar o plano sem a adesão do banco.
O documento não esclarece qual avaliação o BNDES faz das condições acordadas nos planos, mas o banco diz na petição que “as recuperandas poderiam ter negociado de maneira apropriada com o credor ora requerente, cujos canais sempre estiveram abertos para os seus representantes e os seus consultores financeiros. Não o fizeram, preferindo o perigoso caminho da alteração da verdade dos fatos para iludir o Poder Judiciário e obter benesses que não lhe poderiam ter sido estendidas.”
Para outros credores, o BNDES é, na verdade, o grande responsável pela TPI ter sido obrigada a recorrer a uma reestruturação. Procurados, o BNDES e a Triunfo informaram que não comentariam o caso.
Outras fontes apontam que a BNDESPar, apesar de ter participação minoritária, teve direito de indicar conselheiro. Amim Alves Murad foi um nome de mercado indicado pelo banco na segunda metade do ano passado. Segundo a ata, ele participou da reunião de conselho que aprovou por unanimidade o ajuizamento dos pedidos de homologação de recuperação extrajudicial nos termos do plano.